Há lugares que nos enchem a alma. Prendem-nos e preenchem-nos e, por isso, queremos sempre ficar um pouco mais, prolongar um momento que gostaríamos que parasse no tempo. Seja pela paisagem, pela arquitetura ou por aquilo que nos traz e dá. Talvez a Herdade do Freixo seja um desses lugares, onde queremos sempre voltar.
O pretexto da visita à Herdade do Freixo era o lançamento das novas colheitas e do novo produto de enoturismo, o piquenique no Oásis das Azinheiras. À chegada, Carolina Tomé, diretora de marketing da empresa, conduziu-nos para um dos pontos mais altos da herdade. Aí, à nossa espera, abrigado na sombra de uma azinheira centenária, esperava-nos uma mesa posta, com produtos regionais, pão, queijo, enchidos, presunto, entre outras iguarias e os vinhos da Herdade. À volta, fardos de palhas com almofadas e mantas convidavam ao descanso e à contemplação. No meio das vinhas, o Oásis das Azinheiras, é um sítio para o deleite dos visitantes. Orientado a poente para admirar o magnífico pôr do sol sobre a planície, é um lugar que nos enche a alma e de onde não queremos sair. Alentejo em estado puro!
A prova de vinhos decorreu ali mesmo, informalmente, com cada um a desfrutar do espaço e do momento, já com toda a equipa do produtor presente, incluindo o talentoso enólogo Diogo Lopes, que recentemente abraçou o projeto. Verificámos que na Herdade do Freixo tudo se desenvolve em torno de um pequeno grupo de pessoas motivadas, apostadas em proporcionar ao visitante uma experiência única.
Os vinhos iam sendo servidos e provados e Carolina Tomé, dona de uma simpatia imensa, ia contando a história do local, das vinhas, da adega e dos vinhos (aqui auxiliada por Diogo Lopes) com a emoção própria de quem lá está desde a primeira hora.
A história original
Ficámos a saber que a propriedade original, pertença da família Vasconcellos e Souza, tinha cerca de 1000 hectares, mas o enólogo Pedro Vasconcellos e Souza (que, entretanto, se desligou do projeto) e alguns investidores constituíram uma parceria, autonomizando cerca de 300 hectares para criar a Herdade do Freixo. Foram então plantados 26 hectares de vinha a que se seguiram, em 2017, mais 9 hectares, totalizando assim os atuais 23 hectares de vinha com castas tintas e 12 hectares com castas brancas.
A vinha foi plantada em solos predominantemente derivados de rochas eruptivas das quais se destacam os quartzo, dioritos e algumas rochas derivadas de xisto, que transmitem aos vinhos um carater particular com frescura e mineralidade bem equilibrada com a fruta, complexidade e capacidade de guarda. Situa-se num local a cerca de 450 metros de altitude, mais fresco nas noites de verão, o que permite uma longa e correta maturação das uvas.
Pretendeu-se, desde o primeiro momento, respeitar a natureza, não interferindo no equilíbrio do ecossistema natural para que os vinhos transmitissem a essência da terra e do lugar. Foram realizados apurados estudos aos solos e escolhidas as castas e os clones que melhor servissem os objetivos do projeto: a produção de vinhos de alta qualidade, intensos, mas frescos e elegantes, com elevado potencial de evolução em garrafa. Para os tintos as castas escolhidas foram a Touriga Nacional, a Cabernet Sauvignon, a Alicante Bouschet, a Petit Verdot e a Syrah. No caso das castas brancas, decidiu-se plantar as variedades Arinto, Sauvignon Blanc, Alvarinho, Chardonnay e Riesling.

A arrojada adega
Quase ao mesmo tempo, iniciou-se a construção da adega que rapidamente ganhou notoriedade pela sua arrojada arquitetura, da autoria do arquiteto Frederico Valsassina. Totalmente subterrânea, desenvolve-se em três pisos numa espiral orgânica de 40 metros de profundidade, iluminada por luz natural, num ambiente quase monástico, onde cada pormenor foi materializado com singular beleza. Coberta por uma colina com uma vinha plantada, a adega é quase invisível do exterior. Apesar do impacto da sua arquitetura, foi projetada tendo em vista a produção de vinho de elevada qualidade, utilizando as mais modernas tecnologias de vinificação, permitindo que as uvas e o mosto desçam por gravidade, sem pressões, nem bombagens. A cave de barricas, no parte mais profunda do edifício, é penetrada por algumas rochas que ficaram da escavação, num cenário dramático de grande impacto visual, potencia a manutenção de uma temperatura e de uma humidade média ideal para a boa evolução do vinho.
O edifício, entretanto, ganhou várias distinções, nomeadamente, em, 2016 o prémio “Paixão pelo Vinho Prémio Especial Arquitetura”, como a melhor adega construída em Portugal nos anos 2006-2016 pela revista PPV, e em 2018 o prémio “Building of the Year, atribuído pelo site ArchDaily de New York e “Melhor Enoturismo do Alentejo”, pela Entidade Regional de Turismo.
O edifício da adega, segundo nos disse Carolina Tomé, tem sido de extrema importância para catapultar a marca Herdade do Freixo e muitas vezes é mais conhecido do que os próprios vinhos que lá são feitos. Assim, acrescenta, é importante comunicar esses mesmos vinhos e esta oferta de enoturismo irá contribuir para isso. Um piquenique no Oásis das Azinheiras tem um preço de 40€ por pessoa e inclui visita à adega, cesta de piquenique para cada 2 pessoas com sabores regionais, entre eles queijos, enchidos e pão, bem como uma garrafa de Freixo tinto e branco Reserva. Não há tempo marcado e as pessoas ficam totalmente livres de regressar à adega até que a mesma feche.
A surpreendente prova

Ao longo da tarde, calmamente, os vinhos foram sendo provados. Fomos confrontados com um conjunto de vinhos brancos surpreendentes pela sua elegância, frescura, persistência e pureza de fruta. Começamos pelo Freixo Terroir Branco 2018, a gama de entrada da casa. Passamos posteriormente para os varietais: Freixo Sauvignon Blanc 2018, Freixo Alvarinho 2018 e o Freixo Chardonnay 2018. De seguida passamos aos vinhos em lançamento. O Freixo Reserva Branco 2018 foi o último branco e certamente o mais completo do conjunto. Combina uvas das castas Sauvignon Blanc, Alvarinho e Arinto. Ainda se apresenta muito jovem, com uma acidez bem vincada. No aroma surgem frutos brancos, vegetal discreto, um ligeiro fumado e alguma tosta. A boca é ampla, complexo, envolvente e fresca, com final persistente.
Passámos depois para o Freixo Terroir Rosé 2018, 100% Touriga Nacional, que apresenta uma bonita cor salmão leve e aroma a flores brancas, framboesa e alperce. Na boca é elegante e fresco com a fruta a sobressair e um final persistente.
Por fim provámos os tintos. Começamos pelo Freixo Terroir Tinto 2017, feito a partir de um lote de Alicante Bouschet, Touriga Nacional e Cabernet Sauvignon. Apresenta uma boa concentração, com aromas a ameixa preta e frutos vermelhos maduros. Na boca apresenta uma boa estrutura, taninos suaves e macios e uma agradável frescura e elegância. Ganhará em ser bebido jovem. De seguida passámos ao Freixo Reserva Tinto 2016 elaborado com as mesmas castas do vinho anterior, mas que beneficia de um estágio de 12 meses em barricas novas de carvalho francês mais 6 meses em garrafa. Apresenta uma cor rubi profunda e um aroma a frutos vermelhos com uma nota terrosa. A boca é fresca e sedosa, com taninos redondos, num perfil complexo e com um longo final. É um vinho de guarda, com grande aptidão gastronómica.
Após a prova e já com a noite a cair dirigimo-nos para a adega, para finalmente a visitarmos e observar no local aquilo que antes nos havia sido descrito. Nessa altura fomos presenteados com uma sessão de Cante Alentejano, entoado por um rancho coral que percorria a rampa ao longo da espiral. A acústica do edifício projetava as vozes graves dos cantadores num momento que nos emocionou. Por fim, um jantar no átrio central da adega, permitiu terminar da melhor forma um dia em tudo memorável.