Foi um privilégio podermos participar no evento de lançamento do “Winemaker’s Selection” um vinho único e extraordinário idealizado no seio da Madeira Wine Company, criado por Francisco Albuquerque, o reconhecidíssimo enólogo do grupo, para assinalar os 600 anos do descobrimento da ilha da Madeira.
Há 600 anos, Tristão Vaz Teixeira, Bartolomeu Perestrelo e João Gonçalves Zarco descobriam a ilha da Madeira. Uma efeméride que justificou a criação de um vinho da Madeira “premium” que deixasse uma marca indelével no historial da Madeira Wine Company e que contribuísse para reforçar a notoriedade destes vinhos a uma escala global.
Para tal, a empresa não poupou meios nem esforços, tanto na fase conceptual, associando-se a uma prestigiada agência de design para criar um “packaging” consentâneo com um vinho tão especial, como na publicitação e organização do evento de lançamento. Foram assim convidados um naipe importante de jornalistas e críticos de vinhos nacionais e internacionais, juntamente com representantes da sua rede de distribuidores oriundos das várias paradas do mundo.
Começando pelo essencial, o dito cujo do vinho, Francisco Albuquerque, que teve “carta branca” para criar este lote tão especial, contou-nos que quis que este fosse representativo do carácter das principais castas cultivadas na Ilha da Madeira: “O que é que se pretende com esta edição? Fazer um vinho marcante uma criação para celebrar os ‘600 anos’, que tem de ter uma dignidade muito grande. Para ter essa dignidade tem de criar memória e para criar memória tem de ser muito bom. O vinho é pensado para reunir as qualidades de todas as castas, desde a grande frescura do Sercial até à riqueza de um Boal ou de uma Malvasia, passando pela especiaria de um Terrantez”.
O fator unicidade
Durante a sessão de apresentação e prova do “MCDXIX, The Winemaker’s Selection”, ato de grande solenidade em que estiveram presentes individualidades e dignitários da ilha para além dos convidados já citados, Francisco Albuquerque disse ainda ter “muita dificuldade em caracterizar este vinho”, não só pela sua unicidade quase irrepetível, como pela complexidade do lote que o inscreve na família dos grandes vinhos generosos denominados “vinhos de meditação”. Chris Blandy, CEO da Madeira Wine Company e anfitrião do evento, acrescentou ainda que o “blend” final é constituído por onze vinhos de colheitas que vão de 1863 a 2004, todos envelhecidos segundo o método tradicional de “canteiro”.
Feitas as contas, existia matéria para fazer 600 garrafas, tantas quantas os anos que passaram sobre o povoamento da Ilha da Madeira, mas como a efeméride é verdadeiramente especial e irrepetível, decidiu-se que as garrafas seriam “magnum” e evidentemente numeradas!
Para reforçar a dignidade do vinho era necessário que as garrafas e a respetiva embalagem fossem igualmente especiais e, para isso, a Madeira estabeleceu uma parceria com a Omdesign no sentido de dar vida e forma a este projeto único e exclusivo.
Inspiração do séc. XVIII
Em concertação com os clientes, a agência “caprichou”, criando uma caixa-estojo produzida em madeira de Vinhático com um entrançado de vime característico do artesanato e aplicações de prata nas laterais. O interior é todo revestido a alcântara. A garrafa de cristal, soprada à mão, possui uma aplicação de prata portuguesa cravada e cinzelada manualmente por artesãos nacionais. O formato da garrafa é inspirado no modelo de uma garrafa produzida no século XVIII nos Estados Unidos.
Destaca-se ainda o certificado de autenticidade que acompanha cada garrafa de impressão luxuosa e apresentado num envelope decorado de bordados da Madeira, outra homenagem do produtor aos artesãos madeirenses.
A par do lançamento do lançamento do “MCDXIX, The Winemaker’s Selection”, que decorreu no Blandy’s Wine Lodge, a Madeira Wine Company lançou ainda três novos Frasqueira e três novos Colheita.
O vinho é pensado para reunir as qualidades de todas as castas, desde a grande frescura do Sercial até à riqueza de um Boal ou de uma Malvasia, passando pela especiaria de um Terrantez.
A excelência da prova
Mas vamos ao que interessa, a prova do vinho que levou meio mundo ao Funchal numa amena tarde de setembro. Após o cerimonial da revelação do vinho magistralmente dirigido por Chris Blandy, e passado o momento de admiração geral da sala com o desvelar do belíssimo estojo que continha o primeiro exemplar deste néctar exclusivo, os ânimos serenaram e os provadores concentraram-se na prova. Ouviram-se alguns brados de entusiasmo nomeadamente por parte de uns convidados chineses que estavam sentados ao nosso lado. Também Neil Martin, o crítico inglês, ex-provador da Wine Advocate e recente amador de Madeiras, expressou algumas considerações com que concordei.
O primeiro impacto aromático era de uma complexidade extraordinária abarcando descritores tão variados como pele de laranja seca, cravinho, água mel ou “mobília velha” de madeiras exóticas. Numa segunda leitura, o vinho mostrou-se mais austero mas, sobretudo, mais assertivo, revelando uma paleta aromática mais característica do perfil da Sercial e do Verdelho que serão seguramente dominantes no lote cuja fórmula parcelar Francisco Albuquerque não revelou.
A boca fresca e salina marcada por laivos elegantes de molho de soja ou salivantes de laranja amarga confirmou a dominância das castas acima citadas mas a sensação texturada e envolvente que captura notas complexas de pois claro bolo da madeira, melaço e erva doce reportam ao perfil mais generoso da Malvasia e de melaço da Bual que justificam o teor de açúcar residual de 100 g/Lt. Trata-se, efetivamente, de um Madeira marcante que deixa uma memória de prova indelével pela sua enorme persistência. A Madeira merece um vinho de celebração que pode perdurar até ao próximo centenário. Os privilegiados que vão poder desembolsar os cerca de 4.500 euros que custa cada exemplar deste “MCDXIX, The Winemaker’s Selection” estarão sujeitos a um dilema existencial que todos gostaríamos de vivenciar, “to drink or not to drink”…